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Comprova

Para desqualificar presidente da UNE, boato diz que ele estuda Ciências Sociais há 15 anos

Em 2004, Iago Montalvão tinha 11 anos de idade. Ele passou por outros cursos, mas atualmente é estudante de Economia da USP

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São falsos os posts de redes sociais que dizem que o presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão Oliveira Campos, teria 33 anos e seria estudante de Ciências Sociais desde 2004 (ano em que ele completou 11 anos).

Na verdade, ele tem 26 anos e, desde 2018, é estudante de Ciências Econômicas na Universidade de São Paulo (USP), no qual foi aprovado por meio do Sistema de Seleção Unificada (SISU). Antes disso, foi estudante de História em três diferentes instituições de ensino superior.

A primeira matrícula foi em 2011 na Universidade Federal de Goiás (UFG). Mais tarde, pediu transferência para a Universidade de Brasília (UnB) e em 2017 ingressou na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo.

Além da idade e das informações sobre o ingresso na universidade, a publicação erra o nome de Iago ao chamá-lo de “Tiago” e “Thiago”.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

Como verificamos

O Comprova buscou informações sobre a formação acadêmica de Iago Montalvão na página oficial da UNE e também buscou seu nome completo no Google, onde encontrou diversos links de universidades com sua aprovação no vestibular.

Para confirmar que ele de fato estudou nas instituições mencionadas, entramos em contato com a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Federal de Goiás (UFG), a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e a CESMAC (AL).

Localizamos, ainda, o Currículo Lattes, usado por acadêmicos, com o nome completo de Iago, atualizado pela última vez em março de 2013.

Foram encontradas ainda reportagens na imprensa sobre a eleição de Iago Montalvão para a presidência da UNE e posicionamentos dele a respeito dos bloqueios nas verbas das universidades federais e o programa Future-se. Encontramos também registros das manifestações do dia 13 de agosto, em São Paulo, retratados na imagem usada na postagem.

Também foi verificado, junto às páginas oficiais das instituições de ensino, o tempo máximo de permanência em cada um dos cursos iniciados por Iago.

A equipe do Comprova entrou em contato com os autores dos posts originais no Facebook por meio de mensagens, mas não obtivemos resposta até a publicação deste texto.

Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.

Quem é Iago Montalvão?

A UNE publicou, em 14 de julho de 2019, um perfil do presidente Iago Montalvão após sua eleição durante o 57º Congresso da UNE, em Brasília. O texto afirma que Iago é goiano, “conterrâneo e sucessor de Honestino Guimarães e Aldo Arantes”. Iago foi eleito com 4.053 votos (70% do total) pela chapa Tsunami da Educação.

No texto, consta que Iago foi membro do Grêmio do Colégio Aplicação, em Goiânia, onde fez toda a formação escolar e onde “sempre esteve na militância”. Ele foi cotista de escola pública na Universidade Federal de Goiás (UFG), onde cursou três anos de História.

No texto da UNE, Iago afirma que, embora queira terminar um dia o curso de História, viu na USP a oportunidade de expandir o conhecimento na área de Economia, pois considera que “falta no país uma opinião elaborada de economistas no campo da esquerda, progressista”.

Iago Montalvão é filho do professor universitário Romualdo Pessoa, que foi presidente do Sindicato dos Docentes das Universidades Federais de Goiás (Adufg). No site da Associação, há uma publicação noticiando a eleição de Iago e declarações do pai, que, segundo o texto, também fez parte do movimento estudantil desde os tempos de secundarista.

Ele tem 33 anos?

Não. Iago nasceu em Goiânia (GO) em 14 de maio de 1993 e tem, portanto, 26 anos. O líder estudantil enviou ao Comprova uma imagem de sua carteira nacional de habilitação, que confirmou que as informações de filiação e data de nascimento são as mesmas de outras fontes, como a nota no site da Adufg sobre seu pai e os textos sobre Iago no site da UNE.

Ele estuda Ciências Sociais desde 2004?

Não. Iago Montalvão é aluno do curso de Ciências Econômicas da Universidade de São Paulo (USP), no qual foi aprovado por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) de 2018. Em seu perfil oficial no Twitter, Iago diz que é estudante de Economia da USP “graças ao SISU!”.

Ao Comprova, a Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA/USP) confirmou que ele é aluno do curso.

Há 15 anos, em 2004, data que a postagem afirma que Iago se matriculou no curso de Ciências Sociais – sem especificar uma instituição –, Iago tinha apenas 11 anos de idade.

Que cursos universitários ele já fez?

Antes de estudar Economia, Iago também foi aluno de História da Universidade Federal de Goiás (UFG), da Universidade de Brasília (UnB) e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

A UFG confirmou ao Comprova que Iago ingressou no curso de História em 2011 e informou que ele pediu transferência para outra instituição em 2016. A UnB confirmou que Iago Montalvão foi estudante da instituição “entre o 1º semestre de 2016 e o 1º semestre de 2018, no curso de História, mas não concluiu a graduação”.

Um currículo Lattes acessado pelo Comprova na segunda-feira (4), com o nome e a foto de Iago, dizia que ele cursou Engenharia Elétrica na CESMAC, em Maceió, a partir de 2010; e Física na Universidade Federal de Alagoas (UFAL) a partir de 2008. No entanto, ao Comprova, Iago negou ter feito os dois cursos e não soube dizer como a informação foi parar no currículo. Segundo Iago, a última alteração que havia feito em seu Lattes foi para cadastrar um projeto de iniciação científica que fez ainda na UFG, entre 2013 e 2014. Após o contato do Comprova, Iago alterou o Lattes, ainda na segunda-feira (4), e as duas instituições já não aparecem mais no currículo.

O nome de Iago não consta das listas de aprovados na Ufal para 2008 e no CESMAC para o segundo semestre de 2010. Em 2008, Iago tinha 15 anos.

O que disse sobre políticas públicas de educação do governo?

Iago Montalvão tem feito críticas às políticas do governo federal voltadas para a área de Educação. Em 17 de julho deste ano, três dias após a sua eleição como presidente da UNE, interrompeu uma fala do ministro da Educação, Abraham Weintraub, durante a apresentação do programa Future-se para criticar a proposta.

“Ministro, cadê o dinheiro da educação? Queremos solução para os estudantes que estão sem bolsa. Queremos uma resposta para isso, uma resposta imediata. Como vamos pensar um projeto para o futuro se no presente não funciona?”, questionou, segundo publicação do site da Revista Fórum.

Em entrevista ao Comprova, Iago afirmou que a circulação do conteúdo verificado pelo Comprova começou após um ato em frente ao MEC, que terminou em pancadaria e depois de ele interpelar o ministro Weintraub durante o evento do Future-se no Inep.

Em 13 de agosto, o site Vermelho, que é gerido pela Associação Vermelho em convênio com o partido PC do B, também publicou uma matéria sobre o ato “Tsunami da Educação” e apontou que, segundo Iago, o presidente Bolsonaro escolheu a educação como “inimiga”.

Dias antes, numa entrevista ao site Rede Brasil Atual, de uma união de sindicatos, Iago Montalvão falou sobre o bloqueio de verbas para as universidades e disse que “atacar as universidades federais é atacar o desenvolvimento do país, é atacar a retomada do crescimento e a perspectiva de futuro que a gente tem”.

No site da UNE, há uma série de publicações em que a instituição presidida por Iago se posiciona contra os cortes em orçamento das universidades e o Future-se, além de convocar greve geral de professores, estudantes e técnicos.

A foto é verdadeira?

Sim. A imagem usada na postagem foi feita em 13 de agosto deste ano em São Paulo, durante a manifestação “Tsunami da Educação”. A mesma imagem é usada como foto de capa da página de Iago Montalvão no Facebook. Outras imagens parecidas foram compartilhadas por ele em seu perfil no Twitter. O Comprova encontrou a fotografia por meio da busca reversa no Google.

A mesma imagem foi postada no site Vermelho, com crédito para a fotógrafa Karla Boughoff, que também é autora de outras fotos do mesmo dia, postadas na conta oficial da UNE no Flickr, site de compartilhamento e armazenamento de imagens.

Contexto

Esta não é a primeira vez que este conteúdo falso viraliza nas redes sociais. No dia 17 de agosto deste ano, quatro dias após a manifestação “Tsunami da Educação”, Iago Montalvão publicou em sua conta no Twitter uma postagem em que desmentia um conteúdo parecido.

Usando outra foto de Iago Montalvão, as postagens afirmavam que “Thiego Lula da Silva”, de 33 anos, era estudante e diretor da UNE, estava há 15 anos matriculado no curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Pato Branco, junto com uma declaração atribuída a ele: “Devolvam nosso futuro”. A Universidade Federal Tecnológica do Paraná, que foi criada em 2005 – há 14 anos -, não possui um curso de Ciências Sociais no campus de Pato Branco.

Na foto compartilhada em agosto, Iago usava um boné e uma camisa branca com a logo da UNE. Já na postagem compartilhada a partir do dia 1º de novembro, a imagem usada é de uma manifestação em agosto, em que o presidente da UNE usa uma camisa com uma imagem de Fernando Santa Cruz, que foi um estudante e militante do movimento estudantil brasileiro, um dos símbolos da resistência à ditadura militar do Brasil. Ele desapareceu em 22 de fevereiro de 1974, no Rio de Janeiro, aos 26 anos. Registros oficiais vinculados à Comissão Nacional da Verdade indicam que seu desaparecimento ocorreu “em razão de morte não-natural, violenta, causada pelo Estado Brasileiro”.

Em julho de 2019, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou que “Santa Cruz foi morto por correligionários que combatiam a ditadura a fim de evitar o vazamento de informações confidenciais”. Seu filho, Felipe Santa Cruz – atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), decidiu interpelar o presidente para esclarecimentos por causa das afirmações sobre o paradeiro de seu pai. A família de Santa Cruz foi à Procuradoria Geral da República (PGR) cobrar explicações de Bolsonaro sobre as declarações.

As ofensas de Bolsonaro começaram no dia 29 de julho, ao reclamar sobre a atuação da OAB no caso Adélio Bispo, autor do atentado a facadas ao então candidato durante uma passeata na cidade de Juiz de Fora, em 6 de setembro de 2018. O presidente disse que “se o presidente da OAB quiser saber como o pai desapareceu no período militar, eu conto pra ele”. Fernando Santa Cruz é um dos símbolos do movimento estudantil – alguns diretórios estudantis em universidades foram batizados com seu nome: aqui e aqui.

Repercussão nas redes

O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.

O texto verificado foi publicado pela página Jovens de Direita, no Facebook, e teve 2,3 mil curtidas e 779 compartilhamentos até o final da manhã desta segunda-feira (4). No início da tarde, o post, que havia sido compartilhado de um perfil pessoal no Facebook, foi excluído. O Comprova tentou contato com o dono do perfil e com a página Jovens de Direita, mas não obteve resposta.

Conteúdo similar também foi publicado nos perfis @anewellss e @mansi_jose, no Twitter, somando mais de 100 interações, e na página Intervencionistas do Brasil, no Facebook, com 185 curtidas e 187 compartilhamentos até a noite de segunda-feira.

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Investigação e verificação

GaúchaZH, Band, UOL e Correio participaram desta investigação e a sua verificação, pelo processo de crosscheck, foi realizada pelos veículos Folha, Estadão e Poder 360.

Projeto Comprova

Esta reportagem foi elaborada por jornalistas do Projeto Comprova, grupo formado por 24 veículos de imprensa brasileiros, para combater a desinformação. Em 2018, o Comprova monitorou e desmentiu boatos e rumores relacionados à eleição presidencial. A edição deste ano está dedicado a combater a desinformação sobre políticas públicas. O SBT faz parte dessa aliança.

Desconfiou da informação recebida? Envie sua denúncia, dúvida ou boato pelo WhatsApp 11 97795 0022.

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