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Comprova

FALSO: Auxílio-reclusão é garantido por lei desde 1960 e seu valor é equiparado ao salário mínimo

Confira a verificação realizada pelos jornalistas integrantes do Projeto Comprova

Projeto Comprova/Divulgação
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FALSO: É falso um vídeo que circula na internet em que um homem afirma que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria criado o auxílio-reclusão e que, com esse benefício, familiares de detentos receberiam de R$ 2,5 mil a R$ 4 mil. O auxílio é garantido por lei desde 1960 e o valor é equiparado ao salário mínimo, que em 2022 é de R$ 1.212. O autor da publicação também mente ao afirmar que o direito à saída temporária dos presos teria sido criado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), cujos ministros teriam sido todos nomeados por Lula. A saída temporária está prevista pela Lei de Execução Penal e apenas três dos 11 magistrados do Supremo foram indicados pelo ex-presidente.

Conteúdo investigado: Em vídeo, um homem identificado como José do Brasil afirma que o auxílio-reclusão foi criado pelo ex-presidente Lula (PT) e que os beneficiários recebem de R$ 2,5 mil a R$ 4 mil enquanto a família da vítima do crime fica desamparada. O homem também diz que o benefício da saída temporária é concedido pelo STF que, segundo José, é composto por ministros indicados por Lula. No vídeo, o autor trata Justiça e STF como sinônimos.

Onde foi publicado: TikTok

Conclusão do Comprova: Ao contrário do que diz um vídeo que viralizou nas redes sociais, o auxílio-reclusão, concedido a dependentes de presos em regime fechado que sejam de baixa renda, não foi criado pelo ex-presidente Lula e seu valor não varia de R$ 2,5 mil a R$ 4 mil.

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O auxílio foi criado pelo governo de Getúlio Vargas, em 1933, através do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos. Na época, o benefício era voltado apenas a trabalhadores da navegação. Em 1960, o auxílio foi expandido para a população geral e, desde 1988, é assegurado pela Constituição Federal. Sua criação e regulamentação, portanto, precedem a gestão de Lula, que ocupou a presidência entre 2003 e 2011.

Segundo o próprio INSS, desde 2019, o valor do auxílio-reclusão é equiparado a um salário mínimo, que em 2022 é de R$ 1.212.

O autor do vídeo também mente ao dizer que a saída temporária dos presos é um direito criado pela Justiça e que todos os ministros do STF foram indicados por Lula. Na realidade, a saída temporária é prevista pela Lei de Execução Penal, decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pela Presidência da República em 1984, e é utilizada como forma de ressocialização dos presos. Já em relação aos ministros do STF, apenas três (Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Dias Toffoli) dos 11 foram escolhidos pelo ex-presidente Lula.

Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. Até 14 de abril, o vídeo teve mais de 103 mil visualizações, 4,5 mil curtidas e 718 comentários.

O que diz o autor da publicação: O Comprova entrou em contato com José do Brasil por meio do e-mail registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e também pelos endereços disponíveis nas redes sociais. Além disso, foram enviadas mensagens para dois perfis no Facebook identificados como sendo de José do Brasil, mas não houve retorno até o fechamento desta checagem.

Como verificamos: Como o autor do vídeo faz uma série de afirmações a respeito das legislações penal e constitucional brasileiras, o primeiro passo da verificação foi checar as informações em sites de órgãos oficiais como o STF, a Câmara Legislativa, o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) e o próprio Governo Federal (aquiaquiaquiaquiaqui e aqui).

O Comprova também se baseou em reportagens jornalísticas que tratam do auxílio-reclusão e do processo de escolha dos ministros do Supremo (Poder360Folha de São PauloCNN Brasil e UOL Notícias), além de verificações realizadas por outras agências de checagem como Lupa e Aos Fatos.

A equipe entrou em contato com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para entender se o Estado oferece algum tipo de auxílio para os familiares de vítimas de latrocínio e para esclarecer as mudanças sofridas na lei que determina as condições para recebimento do auxílio-reclusão.

José do Brasil, autor do vídeo verificado, também foi procurado.

Auxílio-reclusão foi criado pelo menos 43 anos antes de Lula

O auxílio-reclusão é um benefício pago aos dependentes de segurados de baixa renda que estejam presos em regime fechado. O objetivo é garantir a sobrevivência da família do interno que contribuiu com a Previdência Social antes do período de detenção.

O auxílio foi instituído para a população geral em 1960 pela Lei nº 3.807 e é assegurado pelo artigo 201 da Constituição desde 1988. No entanto, esse direito já existia para os trabalhadores do setor de navegação desde 1933, quando foi criado o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos.

Em 1991, durante o governo Collor, o pagamento do auxílio passou a ser regulamentado com a Lei nº 8.213 e a última mudança no texto foi realizada após a Reforma da Previdência, em 2019. Na ocasião, o tempo de contribuição com a previdência para concessão do benefício passou a ser de 24 meses. Anteriormente, o auxílio independia de qualquer período de carência.

Portanto, a criação e regulamentação do benefício são anteriores à gestão de Lula, que ocupou a presidência entre 2003 e 2011.

Quem pode receber o benefício e valores pagos

No vídeo, o homem dá a entender que os familiares de todos os presos teriam direito ao auxílio e afirma que o valor pago aos beneficiários varia de R$ 2,5 mil a R$ 4 mil. No entanto, para ter direito ao benefício, é preciso que o trabalhador encarcerado seja de baixa renda e que, no momento de sua prisão, tenha renda mensal bruta igual ou inferior a R$ 1.655,98 (valor atualizado em portaria interministerial de janeiro deste ano). O detento ainda precisa ter contribuído com a Previdência Social pelo período mínimo de 24 meses anteriores à prisão.

Conforme o INSS, quem recebe o auxílio são os dependentes do preso, podendo ser cônjuge ou companheiro; e pais ou filhos e irmãos não emancipados. O período de pagamento depende da situação conjugal e da idade dos beneficiários.

Porém, se o segurado preso estiver recebendo outros benefícios como auxílio-doença, pensão por morte, salário-maternidade, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, seus familiares não têm direito ao auxílio-reclusão.

Segundo informações do INSS, desde 2019 o valor do auxílio-reclusão é equiparado a um salário mínimo, que em 2022 é de R$ 1.212.

De acordo com o boletim estatístico da Previdência Social, atualmente, o INSS tem 36,4 milhões de beneficiários. Desse total, 23.124 (ou 0,06%) receberam o auxílio-reclusão em fevereiro deste ano, num valor médio de R$ 1.300,62.

| Legenda: Número total de beneficiários do INSS em fevereiro de 2022.

| Legenda: Número total de beneficiários do auxílio-reclusão em fevereiro de 2022.

O número de beneficiários do auxílio-reclusão representa cerca de 2,8% do total da população carcerária no país. O último Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias do DEPEN, atualizado em junho de 2021, mostrou que o Brasil tem 820.689 presos, dos quais 332 mil estão em regime fechado.

Familiares de vítimas de latrocínio não possuem benefício específico

A única informação verdadeira divulgada no vídeo é a de que, em caso de latrocínio, a família da vítima não recebe nenhum auxílio destinado a essa situação.

Segundo o INSS, não há nenhum benefício previdenciário específico para dependentes de vítimas de latrocínio ou outros crimes violentos. Nesses casos, explica o órgão, o benefício que pode alcançar os familiares é o da pensão por morte, uma vez que a vítima se enquadre nas regras gerais deste benefício.

Para ter direito à pensão por morte, os dependentes devem comprovar que o falecido possuía qualidade de segurado do INSS e que exercia atividade em área urbana ou rural, sendo pescador artesanal ou indígena que produz em regime de economia familiar.

A saidinha e os ministros do STF

Ao contrário do que afirma o autor do vídeo, a saída temporária dos detentos é um direito previsto pela Lei de Execução Penal desde 1984. De acordo com a legislação, presos em regime semiaberto que não estão cumprindo pena por crime hediondo, que resultou em morte, podem sair temporariamente da prisão para visitar a família, frequentar um curso profissionalizante ou participar de atividades "que concorram para o retorno ao convívio social".

No entanto, não são todos os detentos que têm direito às saídas. Conforme a lei, os internos precisam ter o cumprimento mínimo de 1/6 da pena se ele for réu primário e 1/4 se ele for reincidente, além de ter bom comportamento.

Além disso, segundo matéria do G1, para exercer o direito de cinco saídas ao ano, o detento precisa fornecer à Justiça um endereço onde pode ser encontrado durante o período em que estiver fora do sistema prisional e todas as saídas são programadas com dia e hora de egresso e de retorno.

O autor do vídeo também engana ao dizer que todos os ministros do STF foram escolhidos por Lula. Atualmente, três dos 11 magistrados foram indicados pelo ex-presidente: Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Dias Toffoli.

Luiz Fux, atual presidente, foi indicado por Dilma Rousseff, assim como Rosa Weber (vice-presidente), Roberto Barroso e Edson Fachin. O decano, Gilmar Mendes, foi escolhido por Fernando Henrique Cardoso. Alexandre de Moraes foi indicado por Michel Temer e Jair Bolsonaro é responsável por duas indicações: Nunes Marques e André Mendonça.

O STF é composto por 11 ministros que devem ser indicados pelo presidente da República. Para ser nomeado, é preciso ser brasileiro, ter entre 35 e 65 anos, ter amplo conhecimento jurídico e não ter nenhum histórico de acusação ou suspeita. A indicação é então avaliada pelo Senado e caso a posse seja confirmada, o ministro pode permanecer no STF até completar 75 anos.

Quem é o autor

O homem que aparece no vídeo é o comerciante de 36 anos José Pereira de Oliveira. Ele é conhecido como José do Brasil e foi candidato a deputado estadual no Espírito Santo em 2018 pelo DC (Democracia Cristã), mas não se elegeu.

Na descrição da conta do TikTok, o comerciante afirma ser pré-candidato a deputado federal nas eleições de 2022. Já em um vídeo publicado no Facebook, José diz que teve a candidatura rejeitada por "todos os partidos" em razão da quantidade de votos que recebeu no último pleito. Na gravação, o homem ainda ressalta que o único candidato que apoiará nas eleições é Jair Bolsonaro.

A maioria das publicações nos perfis de José do Brasil são de apoio ao atual presidente e críticas aos governos do PT e, em especial, a Lula, também pré-candidato ao Planalto em 2022.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizaram a respeito da pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. Dentro deste escopo, são selecionadas as publicações de maior alcance. Conteúdos que contêm informações falsas sobre presidenciáveis, como Lula, podem influenciar no processo de escolha dos candidatos. O voto é o principal instrumento de participação popular em uma democracia. A decisão sobre o candidato deve ser tomada com base em informações verdadeiras e confiáveis.

Outras checagens sobre o tema: As agências Lupa e Aos Fatos investigaram o vídeo e chegaram ao mesmo entendimento, de que as informações ditas pelo homem são falsas. Em 2018, a Aos Fatos também verificou um conteúdo falso que atribuía a criação do auxílio-reclusão ao governo do PT. O Comprova mostrou, recentemente, que enquete em restaurante de MG não pode ser considerada pesquisa eleitoral e que não há ligação entre o governo Bolsonaro e a criação da ferrovia que liga o Pará ao Maranhão.

Investigação e verificação

Metrópoles, O Dia e O Plural participaram desta investigação e a sua verificação, pelo processo de crosscheck, foi realizada pelos veículos Poder 360, Nexo, A Gazeta, Estadão, SBT e SBT News.

Projeto Comprova

Esta reportagem foi elaborada por jornalistas do Projeto Comprova, grupo formado por 40 veículos de imprensa brasileiros, para combater a desinformação. Iniciado em 2018, o Comprova monitorou e desmentiu boatos e rumores relacionados à eleição presidencial. Agora, na quinta fase, o Comprova segue verificando conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal e eleições, além de continuar investigando boatos sobre a pandemia de covid-19. O SBT e SBT News fazem parte dessa aliança.

Desconfiou da informação recebida? Envie sua denúncia, dúvida ou boato pelo WhatsApp 11 97045 4984.

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