ENGANOSO: Posts enganam ao associar Bolsonaro e a Maçonaria ao satanismo
Confira a verificação realizada pelos jornalistas integrantes do Projeto Comprova
11/10/2022
Enganoso: Postagens no Twitter enganam ao associar o presidente e candidato à Presidência da República Jair Messias Bolsonaro (PL) ao satanismo. Uma foto de Bolsonaro em um evento da Maçonaria foi editada para inserir três quadros com símbolos supostamente demoníacos. Outras postagens utilizam vídeo do presidente discursando em loja maçônica para sugerir que ele teria prometido "entregar o Brasil a satanás", mas o candidato não faz tais afirmações em nenhum momento da gravação.
Conteúdo investigado: Publicações com imagens e vídeos do presidente Jair Bolsonaro (PL) em loja maçônica e legendas associando-o, assim como a maçonaria, ao satanismo.
Onde foi publicado: Twitter.
Conclusão do Comprova: São enganosas as postagens no Twitter que relacionam Bolsonaro ao satanismo e à maçonaria, e alegam que o presidente teria prometido "entregar o Brasil a satanás" caso seja reeleito.
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Uma das imagens que está circulando no Twitter mostra Jair Bolsonaro em frente a três quadros com símbolos supostamente demoníacos. Na verdade, o conteúdo foi manipulado e as imagens inseridas digitalmente. A foto original foi feita em 31 de março de 2014, quando o presidente esteve em uma loja maçônica em Brasília. No site do empreendimento há outros registros do evento que mostram Bolsonaro usando as mesmas roupas da imagem verificada.
Outros tuítes, que alegam que o presidente teria prometido "entregar o Brasil a satanás", tiveram origem em um vídeo de Bolsonaro discursando em um local com símbolos maçons. O conteúdo circula pelo menos desde 2017, um ano antes de Bolsonaro ser eleito presidente. Em outra versão de sete minutos do vídeo, ele menciona ter 63 anos, o que indica que a filmagem foi feita após o dia 21 de março de 2017, quando o político completou a idade declarada. Em nenhum momento, Bolsonaro promete entregar o Brasil a "satanás" ou a qualquer entidade associada ao satanismo.
No dia 5 de outubro, em uma transmissão ao vivo, Bolsonaro confirmou que esteve na loja maçônica.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga conteúdos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 7 de outubro, as duas publicações no Twitter relacionando Bolsonaro com a maçonaria e o satanismo tiveram 23,4 mil curtidas e 4 mil compartilhamentos. O vídeo do presidente no templo alcançou 12,4 milhões de visualizações, 19,8 mil curtidas e quase 5 mil compartilhamentos.
O que diz o autor da publicação: Nenhum dos perfis que compartilharam as publicações no Twitter permite o envio de mensagens. Por isso, o Comprova buscou pelo nome dos usuários em outras redes sociais, mas não encontrou correspondência.
Como verificamos: Utilizamos mecanismo de busca reversa por imagens do Google, Google Lens, e a ferramenta RevEye Reverse Image Search para rastrear as versões originais da foto e do vídeo verificados, que retratam, respectivamente, Jair Bolsonaro e Augusto Heleno, que atualmente é ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, em uma loja maçônica e Bolsonaro discursando em evento maçônico.
Encontramos a publicação original da foto, datada de 31 de março de 2014, em site associado à loja maçônica em Brasília, de onde a imagem foi removida. Quanto ao vídeo, que mostra um outro episódio, descobrimos postagens datadas de, pelo menos, agosto de 2017 com uma versão de sete minutos do conteúdo investigado.
Também conversamos com o professor do curso de Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e PhD em História, Johnni Langer, para entender as origens e os símbolos da maçonaria.
Por fim, entramos em contato com as assessorias do governo federal e do Grande Oriente do Brasil (GOB), uma das principais representantes da maçonaria no país, assim como com os autores das publicações, mas não houve retorno de nenhuma parte.
Enquanto avançávamos na apuração, na quarta-feira (5), o próprio presidente Jair Bolsonaro comentou o episódio do discurso em evento maçônico, captado no vídeo investigado, e confirmou a veracidade, em transmissão ao vivo em suas redes sociais.
Foto de Bolsonaro na maçonaria foi manipulada para inserção de símbolos
Jair Bolsonaro (PL) não posou em frente a um quadro representando um demônio e outros símbolos supostamente satânicos quando esteve em uma loja maçônica acompanhado de Augusto Heleno e do hoje senador Izalci Lucas (PSDB-DF). A foto original foi cortada e teve a qualidade diminuída, possivelmente para dificultar o rastreamento de sua origem. Além disso, três símbolos, dentre eles a imagem de um bode, figura associada ao satanismo, foram inseridos digitalmente na parede ao fundo:
| Foto original
| Montagem que circula nas redes sociais
A foto original foi registrada quando Bolsonaro esteve na Loja Brasília N. 1882, em 31 de março de 2014, à época deputado federal pelo Rio de Janeiro. Ele estava em seu sexto mandato na Câmara e integrava o PP. Na ocasião, o então-general Augusto Heleno proferiu uma palestra sobre o golpe civil-militar de 1964, que instituiu uma ditadura de 21 anos no país. Na página da loja na internet, há outras fotos do evento nas quais Bolsonaro e o então-deputado Izalci Lucas aparecem, portando as mesmas roupas da imagem no conteúdo verificado:
| Fotos disponíveis neste link
No site da loja maçônica, não consta o arquivo original da foto viralizada, mas essa aparece em diversas postagens de sites e blogs desde 2016, a maioria relacionada às teorias da conspiração sobre a nova ordem mundial.
A palestra chegou a ser divulgada pelo jornal O Globo, na época, mas sem citar Bolsonaro nem Izalci.
Vídeo é verdadeiro, mas Bolsonaro não prometeu entregar o Brasil a satanás
Um dos conteúdos que circulam nas redes sociais afirma que Bolsonaro prometeu, em uma loja maçônica, "entregar o Brasil a satanás caso seja eleito". A imagem traz, ainda, prints ou trechos de um vídeo do presidente discursando em uma loja maçônica, que tem circulado desde o início da semana.
A versão que viralizou nesta semana, aqui investigada, dura apenas cerca de um a dois minutos. Ela mostra Bolsonaro criticando a "questão ideológica", possivelmente referindo-se à esquerda, afirmando tratar-se de um risco "tão ou mais grave que a corrupção".
Ele ainda declara que "não [está] como candidato a nada", mas que, dois anos e meio antes, decidiu andar pelo país para descobrir "como resolver [os problemas da nação] sem dinheiro". Por fim, diz ter ouvido de pessoas do campo e empresários ser necessário "um presidente que não os atrapalhe".
A gravação não é recente e circula em redes sociais pelo menos desde agosto de 2017 ? antes das eleições que o levaram à Presidência da República. Encontramos uma versão de sete minutos do vídeo, que compreende até o final do discurso de Bolsonaro.
Durante o vídeo, Bolsonaro menciona que tem 63 anos. Portanto, isso indica que a filmagem foi feita após o dia 21 de março de 2017, quando o político completou a idade declarada. Cabe destacar que ele encerra a sua apresentação recitando o lema de sua campanha presidencial de 2018: "Brasil Acima de Tudo, Deus Acima de Todos".
Em nenhum momento, ele promete entregar o Brasil ao "satanás" ou a qualquer entidade associada ao satanismo. Pelo contrário, em menos de 30 segundos de vídeo, ele faz referência ao Deus cristão.
Em uma transmissão ao vivo na noite de quarta-feira (5), Bolsonaro confirmou o episódio. "Está aí na mídia agora. Pessoal me criticando, porque fui em loja maçom em 2017. Fui sim, fui em loja maçom", disse. "Eu era candidato a presidente, pouca gente sabia, e um colega falou: ?Vamos lá?. E eu fui. Acho que foi aqui em Brasília. Fui muito bem recebido. Me trataram bem", acrescentou. Não conseguimos confirmar, até a publicação desta checagem, se a loja maçônica no vídeo realmente fica em Brasília.
Uma das três principais entidades representantes da maçonaria no Brasil, como noticiou a Folha de S. Paulo, a Confederação Maçônica do Brasil (Comab) repudiou as publicações associando Bolsonaro e o movimento ao satanismo. Em nota datada de quarta-feira (5), a Comab descreveu a peça de desinformação como "produção covarde, imbecil e oportunista de informações falsas, inverídicas e revestidas de maldades para enganar nosso querido povo brasileiro".
Maçonaria
Conforme o Grande Oriente do Brasil (GOB), outra das três mais influentes instituições maçônicas no país, a maçonaria é uma instituição essencialmente filosófica, filantrópica, educativa e progressista. Apesar de não ser uma religião, a maçonaria "reconhece a existência de um único princípio criador, regulador, absoluto, supremo e infinito ao qual se dá o nome de Grande Arquiteto do Universo".
Ao Comprova, o professor do curso de Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Johnni Langer explicou que a maçonaria foi originada no final da Idade Média a partir de grupos de mestres pedreiros ("mason", em inglês, significa pedreiro) que utilizavam símbolos em suas construções e eram influenciados pelo esoterismo (conjunto de tradições e interpretações ligado à filosofia e às religiões que busca o conhecimento do sobrenatural) e pela tradição judaica.
Segundo Langer, o bafomé (ou baphomet), figura semelhante a um bode, que aparece na imagem manipulada de Bolsonaro, é um símbolo demoníaco relacionado de forma pejorativa aos templários e aos maçons. "Ele é, na verdade, um símbolo criado durante o século XIX como uma forma de sintetizar conhecimentos secretos na forma de Lúcifer, o portador da luz. Entre os esoteristas da época, [o bafomé] não tem relação direta com o satã cristão, apesar de sua semelhança. Mas é comum as pessoas interpretarem o baphomet como sendo satã."
De acordo com reportagem da Folha, entre maçons ilustres estão presidentes americanos (ao menos 15 deles, como George Washington), pensadores (Voltaire), músicos (Beethoven), imperadores (dom Pedro 1º) e militares (Duque de Caxias). O ex-presidente Michel Temer, o ex-governador paulista Márcio França e o ex-prefeito de São Paulo Bruno Covas, morto em 2021, também são. O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, é maçom há mais de duas décadas.
Além deles, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta também faria parte da maçonaria, segundo o UOL. Kassio Nunes Marques, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) apontado por Bolsonaro em 2020, declarou ser mestre da maçonaria em 2010, um grau considerado elevado na organização.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e as eleições presidenciais que viralizam nas redes sociais. Publicações falsas ou enganosas envolvendo candidatos à Presidência, como a peça aqui verificada, podem induzir a interpretações equivocadas da realidade e influenciar eleitores no momento da votação. Os cidadãos têm direito de basear suas escolhas em informações verdadeiras e confiáveis.
Outras checagens sobre o tema: Recentemente, as agências AFP, Aos Fatos e Reuters, e o site Boatos.org, mostraram que o quadro de Baphomet em foto do presidente é montagem. A Lupa também desmentiu suposto tuíte em que Bolsonaro teria dito que a maçonaria é "maior que cristianismo".
Em verificações anteriores envolvendo candidatos à presidência e assuntos religiosos, o Comprova mostrou duas vezes, em setembro e outubro deste ano, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não disse que vai fechar igrejas caso seja eleito.
Em outro conteúdo, foi esclarecido quem é Padre Kelmon, candidato à presidência pelo PTB que ganhou destaque, principalmente, a partir de sua participação em debates na televisão.
Investigação e verificação
Estadão, Crusoé, NSC, Metrópoles e Plural participaram desta investigação e a sua verificação, pelo processo de crosscheck, foi realizada pelos veículos CNN, GZH, Imirante.Com, Correio de Carajás, SBT e SBT News.
Projeto Comprova
Esta reportagem foi elaborada por jornalistas do Projeto Comprova, grupo formado por 42 veículos de imprensa brasileiros, para combater a desinformação. Iniciado em 2018, o Comprova monitorou e desmentiu boatos e rumores relacionados à eleição presidencial. Agora, na quinta fase, o Comprova segue verificando conteúdos suspeitos sobre políticas públicas do governo federal e eleições, além de continuar investigando boatos sobre a pandemia de covid-19. O SBT e SBT News fazem parte dessa aliança.
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