Liga busca abrir espaço para jogadores surdos no cenário competitivo

O som é um dos principais elementos de um jogo de videogame. Entretanto, poucas pessoas imaginam como é jogar sem poder escutar desde uma música tema a até os passos de um inimigo. Excluídos do cenário competitivo, os surdos no Brasil enfim ganharam um espaço no universo gamer: A Liga dos Surdos.

O projeto consiste em criar campeonatos destinados para pessoas com deficiência auditiva e também para jogadores que simpatizem com a ideia de criar uma comunidade baseada na inclusão. O intuito é ressaltar que surdos têm capacidade de interagir com outras pessoas dentro dos jogos e também de competir em nível profissional. 

Criador do canal NerdSurdo, André Luiz "NerdSurdo" Santos é o responsável pelo projeto. Segundo ele, a ideia surgiu depois que ele subitamente perdeu a audição. "Há pouco mais de 2 anos atrás eu tive um problema chamado surdez súbita. Dormi bem e acordei surdo! Foi um processo longo de entender o que que aconteceu, a aceitação. Até hoje não descobri o que causou essa surdez, mas eu fui tentando encontrar formas de resignificar a minha vida depois desse susto", explicou. 

Segundo ele, o universo dos jogos online sempre esteve presente em sua vida e se tornou uma verdadeira fonte de inspiração e superação. "Eu sempre joguei online e uma das formas que eu acabei encontrando foi começar a fazer minhas próprias lives. A Liga surgiu a partir do momento quando eu me coloquei e me aceitei nessa condição de surdez. Inclusive mudei meu apelido para 'NerdSurdo'. Então com as lives e com o nome alguns surdos foram me encontrando e nas transmissões, onde eu acabo contando minha história, de como fiquei surdo e tudo mais", continuou André Luiz. 

"Alguns deles foram me relatando essa falta de presença de surdos nos eventos e de inclusão nos grandes campeonatos. Contaram também a falta de oportunidade para os surdos participarem deles", disse. Diante dessa informação, ele conheceu outro rapaz surdo que desejava criar um campeonato e deram início ao trabalho. 

"Todo dia chegam pessoas novas que simpatizam com a ideia, surdos e outros que querem aprender libras. Fomos  vendo que de fato era uma coisa boa e que estava gerando um resultado bacana então seguimos", conta. 

(Foto: Reprodução) 

Os objetivos
A principal meta da Liga dos Surdos é promover integração. Para André "NerdSurdo", o pontapé inicial já foi dado com o primeiro campeonato de LoL. Mas, antes dos torneios ganharem notoriedade no cenário nacional e até internacional, o programador quer erradicar toda e qualquer diferença e preconceito entre os surdos. 

"Trabalhamos com os próprios participantes do projeto uma questão de transformação interna. Isso porque a gente percebe neles mesmos a diferenciação de que surdo não pode joga e de que surdo vai ser ruim no jogo, de tanto que viveram isso", lamenta André Luiz.

"Muitos deles têm isso enraizado e a gente faz muita conversa com eles pra poder mudar isso dentro deles. Entender que todos têm condição de jogar igualmente. Claro que dentro dos jogos têm vantagens pra quem ouve, mas que não é impossível eles mostrarem suas capacidades", continua.

De acordo com ele, é necessária uma transformação interna da comunidade gamer dos surdos antes de se tornar um exemplo para outras organizações. "Se todo mundo pensasse na inclusão desde o início, não precisaria existir a Liga dos Surdos. Mas, como isso não existe na nossa sociedade, estamos tomando essa iniciativa pra buscar o espaço dos surdos", analisou. 

Jogo duro
Segundo o programador, o início foi a fase mais difícil até o momento. Para André, foi complicado mostrar para a comunidade que o projeto era sério. "Os próprios jogadores no primeiro campeonato não acreditavam muito na ideia, já que estavam baseados em experiências anteriores que tiveram e que não foram boas", conta. 

"Era muita incerteza. O pessoal não conseguia visualizar muito o que seria, o que poderia ser, mas eu já tinha ideia do que eu queria, das coisas que eu acho que é possivel atingir e onde a gente pode chegar. Nosso primeiro campeonato foi em julho e de lá pra cá muita coisa aconteceu e muita coisa melhorou", diz André.

Outro ponto de dificuldade apontado foi a falta de parcerias. De acordo com o responsável pela liga, é impossível realizar ações mais complexas sem investimentos externos. "A gente tenta rodar tudo no lado voluntário e parceiro, mas as vezes precisamos pagar pessoas. A gente busca ainda intérpretes de libras, por exemplo. Temos voluntários, mas depende muito da disponibilidade deles".

  
(Foto: Reprodução)

Diversidade
A Liga dos Surdos já promoveu dois campeonatos em 2019. O primeiro reuniu jogadores de League of Legends (LoL) e o segundo players de Counter Strike: Global Offensive (CS:GO). Após o sucesso dos dois eventos, o projeto pretende expandir as partidas para outros games. 

"Já damos como certo que em 2020 LoL e CS:GO vão rolar. Existe também a possiblidade de Free Fire, Clash Royale e Dota 2. Provavalmente os três vão fazer parte do quadro de campeonatos, só precisamos acertar os formatos e as possíveis equipes", explica André "NerdSurdo".

Além de diversificar os jogos, a Liga dos Surdos quer também ser exemplo de representatividade fora dos games. Segundo o organizador do projeto, a comunidade está aberta para todas as pessoas "sem preconceito de raça, de credo, de sexualidade ou gênero".

"O que a gente quer é a união em torno da comunidade fazendo o melhor e mostrando pro mundo a capacidade dos surdos, servindo de exemplo pra que o mundo todo veja que uma comunidade é capaz de se transformar e de ter um ambiente saudável, competitivo e unido", continuou o programador.

Todas as partidas dos campeonatos promovidos pela Liga dos Surdos são transmitidas através das redes sociais e plataformas de transmissão do projeto. Para se inscrever nos torneios e acompanhar as atividades da comunidade, acesse o site oficial da liga!